sábado, 14 de dezembro de 2013

Moradias em áreas de risco: várzeas de rios e encostas íngremes.

Este texto é originário de um projeto educacional desenvolvido em 2011com a minha turma de regência na Escola Municipal Emílio Leichtveis (município de Taquara). Os alunos àquela época estavam na sexta série (atual 7° ano). Espero que gostem.

1. Um nível de abordagem mais próximo do ensino fundamental

Durante a construção deste pequeno projeto desenvolvido com os alunos partimos de um processo pedagógico que foi desde a construção das maquetes até a compreensão dos principais conceitos envolvidos naquele processo todo.
Em um primeiro momento buscamos compreender o porque das moradias em várzeas de rios e encostas íngremes não são uma boa alternativa ainda mais se houver a prática do desmatamento. Assim, abriu-se a possibilidade de construirmos o conhecimento acerca dos processos desencadeados pelo desmatamento: erosão, assoreamento, deslizamento de terras, etc.
No segundo momento foi questionado o motivo pelo qual as pessoas ali instalarem suas moradias. Surpresa! (?) Já havia nos alunos a ideia de que tal atitude consistia não em uma simples escolha esvaziada de determinantes sociais como a questão da renda. Não! Existia a consciência de que a grande maioria das pessoas ali habita justamente por não terem condições suficientes de morar em bairros bem localizados.

Então, no terceiro momento, montamos um simples fluxograma que recriou o processo histórico que originou o foco deste trabalho: a modernização da economia brasileira que, mesmo ao penetrar no campo foi excludente, contribuiu para gerar um imenso fluxo campo-cidade (êxodo rural) ao desempregar pessoas no campo e aumentar a concentração da propriedade da terra. Tanta gente sem recursos viu-se obrigada a ocupar áreas impróprias, o que não ocorreu sem levar em conta a questão do preço da terra nos meios urbanos.







2. Buscando agora um nível mais elevado de compreensão desta realidade.

2.1. Uma introdução importante.

É muito comum observáramos na mídia em geral verdadeira tragédias envolvendo famílias, na esmagadora maioria dos casos, pobres, e tem suas casas e pertencem total ou parcialmente destruídos por conta de desastres que envolvem processos da natureza. Pois bem. Ai segue uma novidade que muitas pessoas não se dão contam: tais eventos trágicos não meramente “culpa” da natureza ou, como diz outro tanto de pessoas, culpa de quem se expõe a tais ambientes em risco habitando várzeas de rios ou encostas íngremes de morros, por exemplo, como é o foco deste trabalho.
A questão é muito mais ampla. Ela permite, ao buscar as raízes dos fatos que se desencadeiam, que façamos uma busca histórica da criação do Brasil moderno. A modernização econômica do espaço geográfica brasileiro deu-se de forma intensa e potencializando as contradições típicas do capitalismo ao extremo. Nosso país de industrializou de forma robusta no século XX mantendo a miséria e a pobreza das classes que trabalham. Tal modernização espalhou-se por ilhas de prosperidade rural enquanto um oceano de arcaísmo se manteve. Em meio à isso tudo se fez consequente um êxodo rural gigantesco que combinado à especulação do solo urbano relegou milhares de migrantes à ocupações de áreas impróprias para uma moradia digna. E o motivo, neste caso foi apenas um: não tinham condições monetárias para pagar aluguéis em boas áreas residenciais ou então adquirir suas casas próprias. Restou-lhe, entre outras localidades, áreas de risco como várzeas de rios e encostas íngremes. Isto é, estamos aqui tratando de fenômenos naturais si, mas combinados com a intransigência dos processos históricos de expropriação típicos do capitalismo brasileiro. Ninguém que esteja no pleno gozo de suas faculdades mentais e materiais (dinheiro) habitaria uma área de risco a menos que isso lhe seja imposto historicamente. É isso que precisamos ressaltar: opções históricas de como o Brasil iria se modernizar tomadas a décadas geram impactos no futuro.

2.2. Os processos naturais de indução antrópica nas áreas de risco.

A primeira questão a ser respondida é como se dá em determinada área os processos denominados morfogenéticos, isto é, os processos que geram destruição/(re)modelagem das formas de relevo.  Sendo assim devemos levar em conta:

(a) As características dos grandes tipos climáticos que, obviamente à exceção do clima tropical semi-árido, são pródigos em precipitação pluvial. Isso torna ainda mais ofensivo o potencial erosivo dos rios (erosão fluvial) e da chuva (erosão pluvial).
(b) Além disso, as formas de relevo existentes no Brasil. Sabemos que o Brasil é um país onde predominam planaltos e depressões. Sendo assim, encostas íngremes são muito comuns e quanto maior a inclinação da encosta, maior será o potencial erosivo. Porém, temos muitas pessoas morando em planícies fluviais nas margens dos rios, nas várzeas. E, se levarmos em conta que temos climas chuvosos, tais margens são periodicamente alagadas (por isso são denominadas várzeas).
(c) Outra questão importante de ordem natural são as características de rocha e solo da área. Determinados tipos de solos irão ter condições distintas de permeabilidade, coesão e plastibilidade. Isso tudo influi no potencial erosivo.

Porém, tais processos podem ser induzidos por ações antrópicas, ou seja, ações humanas. Mesmo porque tais áreas são ditas de risco justamente pelo fato de representarem riscos à integridade física do homem e de seus artefatos territoriais (habitação, principalmente). No caso deste trabalho a principal ação humana que temos que levar em conta é o desmatamento. A vegetação oferece uma importante resistência à erosão na medida em que ela:

(a) Torna as partículas do solo mais agregado através de suas raízes;
(b) Aumenta a infiltração de água (componente perpendicular) no solo ao invés de permitir que grande parte da água da chuva escoe pela encosta dos morros (o que seria o componente paralelo, ou seja, paralelo à vertente), seja de forma laminar, concentrada ou então difusa.
(c) A menor quantidade de água de escoamento que temos com a vegetação possui justamente por causa desta uma velocidade muito inferior, pois a cada centímetro que percorre as raízes barram esta água assim como a serapilheira (galhos e folhas caídas ao solo e demais corpos orgânicos mortos).
(d) Impede que efeito splash tenha maior abrangência. Tal efeito designa a ação desagregadora que uma gota de chuva gera sobre o solo. O efeito splash é o grande facilitador do trabalho da erosão pluvial quando a água da chuva começa a escoar.

Nas áreas de risco alvo do nosso trabalho nós temos o desmatamento como sendo a principal ação desencadeadora de processos que irão culminar em desastres. Vejamos: