quinta-feira, 4 de agosto de 2011

O MLP (Parte 2): Brasil, os títulos norte-americanos, o FMI e a farsa




Neste segundo artigo sobre o modelo liberal periférico (MLP) irei mencionar o ufanismo em torno do falso protagonismo econômico brasileiro no cenário capitalista mundial e de uma, igualmentre falsa, economia estável e de bases sólidas.


De onde sopram tais ventos travestidos de confiança? Sopram do Planalto subserviente, obviamente, e não sem ajuda da grande mídia com sua cobertura confusa e inexplicativa.
Um bom exemplo é a relação recente Brasil-FMI:



"O Brasil está encontrando condições de solidez pra emprestar recursos ao fundo [O FMI], no passado era o contrário, ele que pegava emprestado. Agora, acumulou as reservas pra poder ajudar a comunidade internacional." Assim disse o ministro da Fazenda Guido Mantga após o empréstimo brasileiro de 10 bilhões ao fundo.
(Folha Online;
http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u579349.shtml).


Relembrando o papel do FMI


O Fundo Monetário Internacional fora criado na famosa Conferência de Bretton Woods (1944) na reta final da 2° Carnificina intercapitalista mundial (esta com a participação decisiva da URSS). Tal conferência criou algumas das bases para que os EUA, os novos "donos do campinho" , organizassem o "jogo" da economia internacional de acordo com seus preceitos imperialistas.

As funções mais famigeradas do FMI somente ficariam expostas nas últimas décadas do século XX quando padrão de acumulação capitalista internacional bem como os parâmetros imperialistas norte-americanos estraram em crise. Era necessária uma ofensiva. Forjou-se então uma brutal crise de endividamento no Terceiro Mundo (isto é, países industrializados ou não que são periféricos no cenário econômico internacinal). Em quem iria socorrê-los desta imenso problema financeiro? Você já deve estar pensando corretamente: o FMI (com o seu irmão Banco Mundial), afinal ele havia sido criado para isso.
Assim, para que esses países pudessem adquirir mais empréstimos para rolar suas dívidas, teriam que sucumbir ao "socorro" das instituições FMI-BM, mas tal socorro não seria dado sem o cumprimento de pesadas e degradantes condições impostas:



 (a) "Independência" dos Bancos Centrais em relação à sua própria nação (algo que já tratei no artigo anterior).




(b) Na primeira fase é exigida a chamada "estabilização econômica" que pressupõe:
 - Manutenção de baixos déficits orçamentários para ajudar a conter a inflação e evitar problemas na balança de pagamentos;
- Manutenção de câmbio desvalorizado para adquirir maior competitividade nas exportações;
- Fazer com que o país possa adquirir reservas em moeda forte (dólar).
- Pacote antiinflacionário para conter a inflação causa pela desvalorização cambial. Mas ao invés de valorizar o câmbio atua sobre a demanda elevando os juros, o que gera recessão.





(c) A segunda fase é a de "Reforma estrutural" onde deverá o Estado-alvo:  - Realizar uma desregulamentação do sistema bancário que diminuirá os créditos subsidiados para agricultura e indústria e gerará uma onde de privatizações de bancos comerciais nacionais;
 - Realizar privatizações de empresas estatais em setores estratégicos (mineração, energia e telecomunicações) que deram-se de maneira totalmente corrupta e nebulosa, mas que para isso exigiram do legislativo alterar a própria constituição;


Adendo: Segue o vídeo "A Vale é nossa". Trata de uma das maiores mineradoras do mundo, criada e desenvolvida com o dinheiro e suor do povo brasileiro e que fora privatizada de forma corrupta em 1997. Seu leilão teve diversas irregularidades, todas ignoradas pela grande mídia!



- Fazer uma reforma fiscal que aumenta os impostos sobre o valor agregado ou sobre a venda, o que transfere os impostos sempre para o consumidor;
- Realizar uma desregulamentação do sistema bancário que diminuirá os créditos subsidiados para agricultura e indústria e gerará uma onde de privatizações de bancos comerciais nacionais;

 
O FMI é um banco com acionistas. E acionistas querem o que?

Não podemos nos esquecer que o FMI é uma instituição internacional financeira. Sendo assim, ela possui controladores, os acionistas. E adivinha qual é o maior acionista e o único com poder de veto no FMI? Pensou em Estados Unidos da América? Acertou mais uma vez.
 



O novo Brasil (para o governo e a mídia)


E nós sabemos: no campo da relações entre agentes do espaço geográfico (seja na escala intranacional, nacional ou internacional) existem relações de poder e dominação. A luta de classes ganha novos personagens e novas roupagens. Compreender a luta de classes no âmbito do imperialismo burguês é fundamental. A ajuda do FMI e de outras instituições não foi feita nas bases da solidariedade e tampouco de preceitos técnicos. Fora instrumento de extração de mais-valor das periferias em proveito das economias centrais, principalmente os EUA.
Veja, por exemplo, o que disse o insuspeito economista estadunidense Eugene Stiglitz que foi presidente do Conselho de Assessores Econômicos no governo do Presidente Clinyon e Vice-Presidente Sênior Para Políticas de Desenvolvimento do Banco Mundial, onde se tornou seu economista chefe. As imagens (que iniciam no instante 2:39) foram recuperadas pelo belo documetário de Silvio Tendler sobre a ótica de geógrafo Milton Santos sobre a globalização:


Recentemente fora divulgada uma falácia: a quitação da dívida externa do Brasil. E mais: que agora passamos de devedores à credores. E tem outra: temos reservas suficientes para enfrentarmos qualquer tsunami econômico internacional. Vamos por partes.

 
1°) O Brasil não quitou a sua dívida externa. Ela continua existindo e, ainda por cima, crescendo. Mas cresce, na verdade, menos que a dívida interna.


Há muita gente que jura que o Lula conseguiu essa proeza. Ao contrário, podemos afirmar que nunca, na história desse país, o Brasil teve uma dívida externa tão elevada. De fato, a dívida externa total do Brasil – dívida externa pública (da União, de estados e municípios), dívida externa de empresas e dívida entre as filiais de empresas sediadas no país com as suas matrizes, no exterior – ultrapassa hoje o montante de US$ 300 bilhões.
(Economista Paulo Passarinho em http://www.rumosdobrasil.org.br/2011/06/03/o-brasil-o-fmi-e-o-mundo/)

Observe que a dívida externa continua crescendo, principalmente e parte privada desta dívida.
 


  
2°) O discurso do Brasil credor casa com aquele outro que eleva o feito de nossas reservas internacionais em dólar.



Já fizemos um esboço deste mecanismo no artigo anterior. O governo compra os dólares que ingressam no país e repassa o equivalente em moeda nacional (em troca dos procuradíssimos títulos da nossa dívida interna). Estes dólares são então investidos em algum lugar para renderem. Mas a que custo? Compramos dólar e pagamos por ele os mais altos juros do mundo (acima de 10%, aqueles que o "nosso" BACEN estipula) e investimos em fundos que nos rendem quase nada ou bem menos: o FMI e títulos da dívida norte-americana. É como se cada um de nós (aqueles que possuem alguma conta corrente) pegassemos dinheiro do cheque especial (cujos juros excedem 100% ao ano) e colocássemos na nossa poupança (que rendem 6% ao ano).

E tudo isso para que? Para garantir ao capital internacional (produtivo ou especulativo) que, quando queira sair do país (e tenha que converter seus reais em dólares), o Banco Central tenha dólares disponíveis para bancar a operação.
 



O gráfico mostra a evolução em crescimento das nossas reservas. Elas hoje ultrapassam a dívida externa. É aqui que o oportunismo opera. As nossas reservas internacionais em dólar em nada tem a ver com a dívida externa. Elas não servem para "quitar" tal dívida. Sua funcionalidade é garantir a liquidez do capital estrangeiro que aqui opera.

Dizer que essas reservas funcionam como uma blindagem para períodos de crise é uma hipocresia. A maioria da população brasileira, 60% segundo os dados do IBGE, ganha até 2 salários mínimos. E de quanto é o salário mínimo? Quinhentos e poucos reais. E qual é o princípio do salário mínimo? É a menor renda que possa garantir ao trabalhador e sua família uma vida digna. Sabemos que quinhentos e poucos reais não garantem dignidade alguma. A crise não chegará. Ela nunca saiu!